quinta-feira, 3 de dezembro de 2015

Diferença entre carência X tempo de contribuição

By 

Professora Cecilia Menezes


“O Homem da Camionete Vermelha” Quando comecei a estudar a legislação previdenciária, tinha muita dificuldade em compreender porque se exigia carência de 180 contribuições para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição. A matemática para mim era óbvia: quem se aposenta com 30 anos de tempo de contribuição (360 contribuições) ou com 35 anos de contribuição (420 contribuições) seguramente já pagou as 180 contribuições de carência.

Então, por que exigir carência de quem já tem contribuições de sobra? Aqui a resposta poderia ser a seguinte: na previdência social a matemática é “diferente”. Ou seja, nem tudo que se conta como tempo de contribuição pode ser contado como carência.

 Para fixar essa lógica particular aplicada pelo legislador na contagem da carência, inventei a estória do “homem da camionete vermelha”.

 Então, lá vai: “Era uma vez um homem que trabalhava por conta própria há 35 anos, mas nunca tinha se inscrito na previdência social, nem pago, portanto, contribuições previdenciárias. Um belo dia, esse homem viu um amigo passar por apertos em virtude de doença grave, e sendo o amigo segurado, pôde contar com a proteção da previdência social.

Então, pensou: “devo me inscrever na previdência, pois vai que acontece comigo o mesmo que ocorreu com o meu amigo.” E mais: “Já que eu tenho um dinheiro sobrando, vou me inscrever, provar que já trabalho há 35 anos, pagar todas as contribuições para esse período, e me aposentar!”


Encheu sua camionete vermelha com documentos que comprovavam sua atividade – declarações de imposto de renda, livros caixa, recibos de pagamentos de clientes, etc – e se dirigiu à agência do INSS situada a duas quadras do escritório.

Diante da documentação comprobatória, considerada suficiente pelo INSS, conseguiu o homem da camionete vermelha provar a atividade remunerada desde 35 anos atrás.

Tendo providenciado sua inscrição, pediu a retroação da data do início de suas contribuições. Solicitou o cálculo das contribuições relativas ao período e se dirigiu ao banco, para efetuar o pagamento dos valores calculados.

 Recolheu as contribuições relativas aos 35 anos, voltou ao INSS e requereu a sua aposentadoria.

Resposta: aposentadoria indeferida. Motivo: não cumprimento de carência.

 O homem endoidou: -Como é que pode eu não ter carência? Quanto tempo é essa carência? - 180 contribuições!

Zangado, o homem da camionete vermelha retrucou: - Então, se eu paguei 420 contribuições, eu tenho carência sim.

Afinal 180 contribuições cabem dentro de 420 contribuições.

Você não sabe fazer contas? - Mas meu senhor, na previdência a matemática é diferente.

 A carência só conta a partir da primeira contribuição paga sem atraso pra quem trabalha por conta própria como o senhor. 

- Como? - O senhor pagou todas as contribuições em atraso.

O senhor tem 35 anos de tempo de contribuição mas zero de carência.

Arrasado, o segurado perguntou: - Então, eu não posso me aposentar? - Não, senhor.

Volte daqui a 15 anos, após ter pago a primeira contribuição em dia e mais 179 contribuições.”

Minha gente, essa estória horrível não se passaria na vida real, pois: 

 Essa estória tanto serve para diferenciar a contagem do tempo de contribuição daquela efetuada para fins de carência, como demonstra outro aspecto importante:

 A filiação precede a inscrição.

  O “homem da camionete vermelha” era filiado à previdência social há 35 anos (o exercício de atividade remunerada determina a filiação automática e obrigatória à previdência social). Entretanto, não havia providenciado sua inscrição na previdência social.

 A filiação é o vínculo com a previdência social do qual decorrem direitos e obrigações. Mas os direitos são condicionados pelo cumprimento das obrigações: inscrição e pagamento das contribuições.

 É isso gente, estórias caricaturais ajudam a guardar a informação.

Exigência de carência e o equilíbrio atuarial

Por que existe essa exigência de carência, contada a partir da primeira contribuição sem atraso?

O benefício de aposentadoria por tempo de contribuição (e também o de aposentadoria por idade) é um benefício programado. Pode-se dizer que é programado para o segurado, mas também para a previdência social.

Como assim? Imagine você que todos os dias chegassem ao INSS “homens da camionete vermelha”, que trabalharam a vida inteira, nunca contribuíram e se preocupassem em sair da informalidade somente no dia em que “tivessem direito” a se aposentar?

 A mensagem seria: “Oi, eu sou filiado há 35 anos, vocês do INSS nem sabiam que eu existia, mas eu quero me inscrever e, de imediato, me aposentar.”

 A previdência social não pode funcionar na lógica do “susto”, sem poder prever os compromissos com benefícios para seus segurados. Lembrar que a Constituição Federal exige a manutenção do equilíbrio financeiro e atuarial.

Quando um segurado se inscreve como contribuinte individual, paga a primeira contribuição sem atraso, e, em seguida, interrompe suas contribuições, ele é considerado pelo INSS, como estando em débito relativamente ao período em que não houve recolhimento, a não ser que ele prove o contrário (interrupção ou desligamento da atividade).

 Nesse último caso, a previdência sabe da existência do segurado e vai leva-lo em consideração nas estatísticas e nos cálculos atuariais

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